Nova arma para combater a dengue
Estávamos em pleno
inverno, ou melhor, a primavera começou outro dia, uma vez que já estamos em outubro. Os dias de calor neste período em muitas cidades paulistas são marcantes porque não é possível uma noite de sono tranquilo sem um eficiente sistema de condicionamento de ar, FRIO.
É o período para a prevenção de transmissão de doenças por mosquitos, pernilongos, etc. Alguns bairros estão infestados de insetos, mosquitos, pernilongos. Prevenção deve ser feita o tempo todo, o ano todo, não somente quando chegam as chances de maior transmissão, o tempo do calor ou das chuvas.
Por inúmeras razões não se realizam ações como se deve. E estamos sempre correndo atrás do prejuízo, apagando incêndios. A dengue tornou-se uma situação de calamidade pública em alguns locais, regiões. Ribeirão Preto, SP, bateu todos os recordes de casos de dengue neste ano.
A população espera por formas de combater a doença, mas mostra pouca co-responsabilidade e colaboração, principalmente de forma coletiva. Nosso jeito, nosso sistema de
saúde, nosso combate ao mosquito deixam a desejar e o emprego de técnicas variadas que envolvem venenos, inseticidas ecológicos, borra de café, cravo da índia, etc. não apresentam resultados satisfatórios.
Campanhas: pontos de vista distintos
E ainda continuam as internações por dengue. Um caso aqui outro acolá. Isso significa que reduziu a transmissão, mas não desapareceu.
A grande novidade da ciência
O controle biológico é um recurso tecnológico que tem trazido sucesso no combate às pragas, reduzindo o consumo de produtos químicos. Um bio combatendo um outro bio ou um bio ajudando outro bio a combater. Manipulações genéticas ou organismos geneticamente modificados tem demonstrado sua utilidade social.
Uma novidade é o mosquito da dengue infectado com uma bactéria. De acordo com dois estudos científicos publicados no dia 24 de agosto último na conceituadíssima revista
Nature uma bactéria inserida em mosquitos transmissores da dengue, ou seja, o
Aedes aegypti, é capaz de impedir que as pessoas contraiam a doença. A bactéria chamada
Wolbachia pode interromper a transmissão do vírus da dengue em mosquitos e invadir as populações selvagens de insetos carregando a doença. Os pesquisadores já tinham conhecimento de um fato: a bactéria
Wolbachia é capaz de evitar infecções em mosquinhas, que ficam em frutas como bananas, conhecidas como
Drosophila, muito usada em pesquisas ou experiências de laboratório. Isto quer dizer que
Drosophila com estas bactérias eram protegidas de infecções por vírus.
Procurando aplicar este achado científico tão interessante, os pesquisadores tentaram com sucesso introduzir a bactéria em um mosquito transmissor de doença por vírus que atinge uma vasta população mundial:
a dengue. É um vírus endêmico presente em mosquitos que se alastram ao longo dos trópicos, provocando febre alta, erupções cutâneas e dor nas articulações. Se não bastasse só isto, a versão hemorrágica da dengue pode matar.
Desta forma o mosquito
Aedes infectado com a bactéria
Wolbachia poderia ser usada para reduzir a exposição para os 2,5 bilhões de pessoas que vivem em regiões endêmicas
(veja mapa), e poderia potencialmente ser aplicada a outras doenças transmitidas por mosquitos, como a febre amarela. Uma notícia especialmente interessante para o Brasil e principalmente para municípios como Ribeirão Preto, onde os casos de dengue alcançaram índices estratosféricos.
Os testes mostraram que omosquito
Aedes aegypticom a bactéria
Wolbachiase contaminava com o vírus transmissor da dengue, mas não passava o vírus para as pessoas. Os estudos mostraram que os mosquitos com a bactéria não conseguem transmitir a doença e assim as pessoas não ficam doentes.
Os estudos foram realizados por um grupo de pesquisadores liderados por Scott O'Neill, da Monash University da Austrália, onde existe um
programa de combate à dengue (Eliminate Dengue Program). Também fazem parte do grupo pesquisadores de outros países, inclusive do Brasil. Luciano Moreira do Centro de Pesquisas André Rachou, da Fundação Osvaldo Cruz, em Minas Gerais faz parte do grupo.
Em estudo publicado em 2009 o mesmo grupo já havia mostrado que outra linhagem da bactéria causava no
Aedes aegyptios mesmos efeitos verificados no trabalho atual, mas dificultava a reprodução do inseto. Nem todos os ovos permaneciam intactos no ambiente como ocorre naturalmente e as larvas morriam antes de se desenvolverem. Isso impedia que a bactéria fosse transmitida para descendentes. Com isto ficava difícil manter este processo na natureza.
Segundo Moreira, ainda não se sabe por que a
Wolbachiabloqueia a capacidade dos mosquitos transmitirem o vírus da dengue. Como exatamente a bactéria
Wolbachia consegue este feito no mosquito ainda não é claro. “Pode ser que haja uma competição em nível celular entre o vírus e a bactéria, presente desde o intestino até as glândulas salivares do
Aedes aegypti”, afirma. Complementa que “Além disso, o inseto com a bactéria tem a imunidade melhorada”.
Os pesquisadores descobriram que infectando mosquitos de laboratório com uma linhagem da bactéria
Wolbachia reduzia a transmissão de dengue. Pode ser que a bactéria
Wolbachia tome controle dos preciosos ácidos graxos (gorduras) que os vírus precisam para se multiplicar, ou que a bactéria deixa que o sistema imunológico reconheça o vírus. Os mosquitos resistentes alimentaram esperanças de que o método poderia ser usado para reduzir a propagação de doenças transmitidas por mosquitos no ambiente.
Segundo a revista The Scientist, Xi Zhiyong, um médico entomologista da Universidade Estadual de Michigan que não estava envolvido no estudo declarou que "Este é um grande passo e é muito emocionante". Enquanto mosquitos resistentes à doença foram criados em laboratório anteriormente, esta é a primeira vez que eles criaram raízes no campo.
No entanto, fazer com que a bactéria
Wolbachia se estabeleça em uma população selvagem de mosquitos parece uma tarefa difícil.
Wolbachia não se espalham a partir do ambiente, mas são herdadas de mãe infectada para os filhos através de células germinativas, disse O'Neill. Enquanto os pesquisadores podem infectar a primeira geração de mosquitos, injetando seus tecidos com a
Wolbachia, sem ser capaz de infectar os ovos, as bactérias não seriam repassadas para sucessivas gerações, impedindo a sua propagação através da população.
Agora, O'Neill e seus colegas criaram um método que lhes permite infectar o tecido reprodutivo. A equipe cresceu
Wolbachia em
Drosophila, extraíu células infectadas e as multiplicou em cultura e em seguida as injetou em células germinativas em embriões de
Aedes aegypti: o mosquito carrega o vírus da dengue. Mosquitos infectados em laboratório, desta forma não transmitiram dengue.
O estudo também mostrou que a bactéria é transmitida de geração em geração dos
Aedese que os mosquitos com
Wolbachiatêm vantagem reprodutiva sobre os demais. Significa que os mosquitos infectados poderão passar a
Wolbachia para sua prole, sugerindo que as bactérias se espalhariam através de uma população de mosquitos se os insetos infectados forem soltos na natureza. Isto realmente aconteceu quando a equipe de pesquisa lançou mais de cem mil insetos infectados com
Wolbachia em duas cidades perto de Cairns, na Austrália e após 10 semanas, a infecção com a bactéria começou a se espalhar, não a doença. Depois de alguns poucos meses, os mosquitos infectados expandiram seu alcance e entre 80% e 100% dos mosquitos capturados nas cidades carregavam a bactéria.
O fato curioso é que a fêmea com a bactéria é capaz de produzir ovos viáveis depois de cruzar com machos infectados ou não infectados pela
Wolbachia. Já as fêmeas sem bactéria só conseguem se reproduzir quando cruzam com machos também não infectados. A tendência esperada pelos pesquisadores é que com o tempo a população de mosquitos com bactéria se torne predominante, reduzindo o risco de transmissão de dengue.
A habilidade de Wolbachia para espalhar resultou da manipulação do sucesso reprodutivo dos mosquitos:
fêmeas não infectadas que acasalam com machos infectados produzem ovos não viáveis. Como as bactérias são transmitidas da mãe para a prole, esta tática essencialmente extermina a prole de não-infectados, enquanto os descendentes de fêmeas infectadas, que recebem as bactérias, sobrevivem. Ao longo do tempo, "indiretamente permite que as bactérias aumentem em freqüência de uma geração para a outra ", disse O'Neill. Ou seja, a cada geração de fêmeas viáveis o número de bactérias vai ser maior.
O estudo atual não pode avaliar se as taxas de dengue realmente reduziram porque os pesquisadores lançaram mosquitos infectados em uma região da Austrália que tem apenas surtos esporádicos da doença. Eles planejam testar a técnica em áreas como a Indonésia e o Vietnã, onde a dengue ocorre com mais freqüência, proporcionando uma medida mais confiável de mudanças na prevalência de dengue.
Luciano Andrade Moreira tenta agora obter apoio do Ministério da Saúde para realizar estudos com variedades do vírus da dengue comuns no Brasil e posteriormente pretende analisar os impactos de insetos inoculados com as bactérias soltos no ambiente.
Usando mosquitos infectados poderia oferecer uma maneira barata e sustentável para reduzir a transmissão da doença, que é importante porque muitas regiões endêmicas estão localizadas em países pobres, disse Xi. "Uma vez que você coloca os mosquitos no local, a bactéria pode se espalhar por si só," ao contrário de pesticidas, que necessitam ser reaplicados constantemente, disse ele.
Além disso, a estratégia apresenta pouco risco para o ambiente, O'Neill disse, porque a bactéria
Wolbachia já habita naturalmente os organismos de cerca de 70 por cento de todos os insetos. Moreira explica que a bactéria inserida no mosquito não deve causar problemas ao ambiente nem às pessoas. Depois de quase dois anos testando diversas possibilidades na Austrália, onde exemplares foram soltos em campo, os pesquisadores não encontraram indícios de que a bactéria seja transmitida para animais que se alimentam dos mosquitos, como lagartixas ou aranhas, nem que saia com a saliva do mosquito ao picar as pessoas.
A equipe formada também por pesquisadores americanos e australianos, liderados por Scott O'Neill da Austrália, investiga desde 2005 essa estratégia. Para os primeiros cinco anos de trabalho, o grupo recebeu US$ 12 milhões, parte doada pela Fundação Bill & Melinda Gates, exatamente,o Bill Gates da Microsoft que criou uma Fundação para financiar projetos de impacto social.
Este método revolucionário também pode ser desenvolvido para reduzir a transmissão de outros vírus, e potencialmente até o parasita da malária que fica hospedado no mosquito
Anopheles, Xi disse. Pesquisa já mostrou que a infecção por Wolbachia reduz a transmissão da malária entre os mosquitos
Anopheles em laboratório, mas o truque está em fazer a bactéria ser transmitida de forma estável neste gênero como O'Neill e seus colegas fizeram com o
Aedes.
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Por falar nisso, os Agentes de Controle de Vetores aguardam anciosos, a entrada do Projeto de Lei à Câmara municipal, para regularizar a situação desta categoria em Ribeirão Preto. Espera-se que a prefeitura envie nesta próxima terça-feira dia 18 de outubro de 2011, para que seja votado.
Os trabalhadores agradecem e a população também. (Marly)